Bem Me Quer by Barral: "Será a gravidez um estado de graça?" - episódio 2

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Na rubrica Bem Me Quer by Barral, vamos estar, quinzenalmente, à conversa com a psicóloga Tânia Correia sobre os vários temas da maternidade, parentalidade e saúde mental de pais e filhos. Neste projeto, contamos, ainda, com o apoio da Barral, um parceiro que se preocupa, acima de tudo, com o bem-estar das famílias.

Depois de, no primeiro episódio, termos abordado o misto de emoções e pensamentos que ocorrem no momento em que recebemos um teste de gravidez positivo, em que descobrimos que vamos ser pais, neste segundo episódio da rubrica Bem Me Quer by Barral, falamos sobre a gravidez propriamente dita ou, se quisermos, o "estado de graça". Vamos tentar perceber com a psicóloga Tânia Correia se é mesmo assim, se esta expressão é válida para todas as mulheres.

 

"'Quem é que eu vou ser depois deste processo, física e psicologicamente?' Nada é previsível. A perda de controlo pode ser angustiante para algumas pessoas."

 

"Em alguns aspetos, podemos considerar que a gravidez é um estado de graça, nomeadamente por causa do empoderamento que algumas mulheres sentem nesta fase. Sentem-se mais capazes, sentem-se deusas da fertilidade, sentem que são tratadas com mais gentileza pelas pessoas que estão à volta. Há mulheres que relatam terem ficado com a pele mais uniforme e luminosa, com o cabelo mais forte… Há, até, aspetos positivos ao nível da sexualidade: no segundo trimestre de gravidez, há um pico da líbido e muitas mulheres dizem que tiveram uma sexualidade como nunca tinham experienciado até então", começou por explicar a psicóloga.

Há, por outro lado, aspetos menos positivos (e sem graça nenhuma!) que fazem com que muitas mulheres não gostem de estar grávidas.

"Temos as alterações de humor que, às vezes, resultam das alterações hormonais. Há coisas que não nos incomodavam nada e que, de repente, se transformam em grandes 'problemas'. E, depois, há as alterações físicas. Há uma grande perda de controlo, não só no humor, não só na forma como reajo, mas, também, na forma como o meu corpo reage e se comporta, e na forma como me vejo, porque a imagem altera-se. O nosso corpo é dos aspetos mais básicos que nós temos e é o que mais nos acompanha desde sempre, mas, de repente, ele começa a ganhar certas formas, a ganhar certas características das quais podemos não gostar tanto, porque nunca nos vimos naquela maneira. Podemos sentir que nos vemos ao espelho e que não nos revemos naquela imagem. E, depois, também, a dúvida: 'Quem é que eu vou ser depois deste processo, física e psicologicamente?' Nada é previsível. A perda de controlo pode ser angustiante para algumas pessoas, além de outros sintomas relacionados com o desconforto: insónias, sono, azia, retenção de líquidos", enumerou.

 

"Eu não gostar de estar grávida é diferente de eu não gostar do meu bebé ou de não vir a desenvolver um vínculo com ele."

 

Nesta fase, surgem, também, inúmeros receios, nomeadamente no que diz respeito à criação do vínculo com o bebé, algo que nem sempre é imediato.

"Eu não gostar de estar grávida é diferente de eu não gostar do meu bebé ou de não vir a desenvolver um vínculo com ele. Cada vez mais, os estudos apontam para a ideia de que a vinculação começa na gravidez, mas nem todas as pessoas a conseguem estabelecer desde aí, o que não é sinónimo de que não vão conseguir depois do nascimento", frisou.

Para os homens, pode ser mais complicado, por não passarem pela experiência de forma tão direta, mas esse não é, à partida, o fator mais impeditivo de criar o vínculo com o bebé, como explicou a psicóloga: "Acho que a sociedade tem um papel fundamental na maneira como o homem se vai, ou não se vai, envolver no processo. O pai tem que ser visto como fazendo parte. Mas há aqui, também, outros fatores sobre os quais é importante aproveitarmos para falar: para algumas pessoas, homens ou mulheres, a gravidez pode ser muito abstrata. Alguns de nós têm necessidade de ter estímulos mais concretos, coisas mais palpáveis, de haver uma interação… e o bebé, ao início, não nos dá isso. Não há interação, não há um cheiro, não há um toque, e, então, não há essa ligação assim tão imediata. Há pessoas cuja maneira de se conectarem com o bebé não é propriamente mexendo na barriga. Há pais cuja forma de se conectarem com o bebé é através da preparação do quarto. Mas é essencial os casais falarem sobre isso, para que ninguém se sinta sozinho no processo."

 

"Eu posso querer muito receber um amor incondicional, mas não estar preparada para o receber, porque nunca o tive."

 

Há, ainda, um outro aspeto que não é tão falado: o vínculo que nós, pais, temos com o nosso bebé está intimamente ligado aos padrões de vinculação que tivemos com os nossos pais e que continuam a viver em nós.

"Se eu não sentia uma ligação tão profunda com os meus pais, isso pode fazer com que eu sinta esse padrão de vínculo a surgir e a impedir-me de me entregar a um amor que é incondicional. Eu posso querer muito receber um amor incondicional, mas não estar preparada para o receber, porque nunca o tive. Os nossos padrões de vinculação saltam neste momento e é como se houvesse uma voz a dizer: 'Tu vais ter que dar algo que não recebeste, como é que tu vais fazer? Vais dar algo que tu não estás habituado a dar, porque também não tiveste?'", alertou.

Ainda sobre o papel da sociedade, não podemos deixar de referir as várias frases que se perpetuam e que magoam e deixam marcas nos futuros pais.

"A frase 'gravidez não é doença' é tão comum e continua a ser perpetuada. Efetivamente, a gravidez não é uma doença, mas é uma condição que, às vezes, limita mais do que uma doença, é uma condição e precisa de ser respeitada. Outra coisa muito frequente é começarem os comentários em relação ao corpo: 'Estás tão gorda'; 'Lá vem a gorda.' É como se a tua aparência física fosse o centro da questão e como se tu te transformasses apenas no teu corpo e não houvesse nada além disso. Ainda dentro desta destes comentários sobre a aparência física, há aquelas comparações entre barrigas: 'A tua barriga está muito pequena, tens de começar a alimentar-te melhor, o teu bebé está a passar fome.' É enorme o peso da culpa que isto coloca em cima de uma mulher que até pode estar a fazer tudo certo e a dar o seu melhor. Há, também, os comentários em relação ao peito, sobre se vais conseguir amamentar. Portanto, nós estamos na gravidez, mas nem conseguimos viver o momento, porque já estamos um passo à frente, a projetar o que vai acontecer, com receio e com pressão. Depois, há a ideia de que trabalhar até ao fim é que é, a ideia de que, se outros já passaram por isto, nós também temos de aguentar, custe o que custar. Mas, depois, se isso custar a saúde do bebé, já vamos culpar a mãe, porque exagerou, e o pai, porque não a impediu", lamentou Tânia Correia.

 

"E é importante acabarmos, também, com o mito das mães guerreiras e dos pais guerreiros, porque isso coloca muita pressão. Há muita gente a sofrer em silêncio."

 

Segundo a psicóloga, o papel da sociedade devia ser, sobretudo, ouvir mais os pais, fazer com que as mães se sintam luminosas e capazes, porque o corpo humano é sábio, e fazer com que elas percebam que têm tudo aquilo de que precisam para enfrentar este processo.

"E é importante acabarmos, também, com o mito das mães guerreiras e dos pais guerreiros, porque isso coloca muita pressão. Há muita gente a sofrer em silêncio, porque pensa que tem de aguentar. As pessoas precisam de ser escutadas, acarinhadas, validadas e precisam de muito apoio", sublinhou.

Esta ideia remete-nos diretamente para o tema do próximo episódio da rubrica Bem Me Quer by Barral, cujo tema é o parto propriamente dito, um momento muito aguardado, desejado e idealizado, mas, igualmente, um momento em que os pais precisam muito de ser cuidados e respeitados.

 

Tânia Correia | Psicóloga, mestre em Psicoterapia Cognitiva-Comportamental na área da infância e adolescência | OPP: 24317

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