Estreou-se no passado dia 15 de setembro a peça "Um Homem Inofensivo", no Teatro Aberto. Filipe Vargas é um dos protagonistas desta história da autoria de Luís António Coelho e com encenação de Álvaro Correia. Em exclusivo à SELFIE, o ator contou-nos que este é um desafio profissional com "uma data de novidades".
"Pela primeira vez, estou a fazer uma peça só com um ator. Somos dois em palco. Na 'Noite de Reis', só para ter uma ideia, estávamos 26 pessoas em cena: eram 13 atores e 13 músicas. Portanto, é uma grande diferença. Agora, estamos a trabalhar mais o pormenor. Também é a primeira vez que estou a fazer uma peça de teatro em que estamos só os dois em palco, desde que a peça começa até ao final. É uma hora e tal em que não há um único momento de descanso. Também é a primeira vez que estou a fazer um texto inédito. É a primeira vez que esta peça está a ser encenada. E também foi a primeira vez em que tive o autor de uma peça a vê-la, sentado na plateia. Muitas das vezes, os autores são autores de [textos] clássicos e já morreram e haver a oportunidade de ter o feedback da pessoa que escreveu e que criou aquelas personagens... Ele ficou muito contente com o trabalho que o Álvaro fez comigo e com o Renato. Ou seja, está a ser uma data de novidades. É uma peça que se destaca bastante pelas suas caraterísticas, por ser mais intimista e por haver um constante pingue-pongue entre as duas personagens", enumerou Filipe Vargas.
O artista não negou que sentiu alguma expetativa por o autor da peça ter assistido à mesma: "Sim, a opinião dele conta muito e queríamos que ele gostasse, porque foi ele quem montou toda aquela situação e aquelas personagens e nós, evidentemente, olhando para aquilo, fizemos uma interpretação, fomos guiados pelo encenador. Mas é claro que há sempre a ansiedade para saber qual é a reação da pessoa. Felizmente, ele adorou e ficou muito, muito contente."
Entre tantas novidades, existe um reencontro: a contracena com o outro ator que protagoniza esta peça, Renato Godinho. "Gosto muito do Renato", começou por nos contar Filipe Vargas, que acrescentou: "Somos muito parecidos numas coisas, muito diferentes noutras, mas somos muito compatíveis e respeitamo-nos muito e confiamos muito um no outro. Numa peça como esta, é fundamental termos confiança na outra pessoa que está em palco, porque somos só dois e aquilo é um pingue-pongue, com uma constante sequência de pergunta-resposta, pergunta-resposta, e tenho absoluta confiança no Renato. Sei que a 'bola', nunca vai cair. Ele é muito trabalhador e talentoso. A primeira vez em que trabalhámos juntos foi há muitos anos, numa telenovela, e agora, na última vez, foi com a 'Noite de Reis', uma peça absolutamente diferente. E isso também é muito engraçado: passarmos os dois de um universo muito diferente, com aquela maluqueira toda e perucas e maquilhagens e música e tudo e mais alguma coisa para um projeto muito mais simples e minimalista. Nós os dois vivemos uma peça muito exuberante e, agora, estamos numa peça muito mais contida. É giro partilharmos essa experiência."
"Um Homem Inofensivo" caracteriza-se por ser uma peça dúbia, convidando os espetadores a construírem a sua própria história, a partir do texto. "A peça arranca com a personagem do Renato - que, por acaso, também se chama Renato - a acordar a meio da noite, na casa dele, e a sentir uma presença qualquer. Ele acende a luz da sala e lá está a personagem que interpreto - e que é um estranho. E, durante a peça, há uma tentativa de o Renato perceber quem é aquela pessoa e por que motivo está ali. Às tantas, falam sobre tudo e mais alguma coisa: família; trabalho; a maneira como nos devemos relacionar com os outros; perdão... Têm visões muito diferentes do mundo. Às tantas, até parece que já são amigos de longa data. E, depois, no final, as pessoas tiram as próprias conclusões. Há várias teorias e interpretações. Será que as duas personagens só são uma? E a personagem do Renato esteve todo o tempo a falar com ele próprio? Seria tudo um sonho? O texto é mesmo muito interessante e, independentemente da análise, a mensagem é transmitida: é uma autoanálise da nossa condição", explicou-nos Filipe Vargas.
Para o ator, este trabalho desafiante distingue-se, também, por ser "delicado": "É uma espécie de um relógio suíço. Estamos os dois num cenário sem muitos objetos. Há sempre uma ligação direta entre pergunta e resposta e é preciso ter muito cuidado com o texto, porque o Renato vai pegar exatamente naquilo que eu disser e vice-versa. Há um cuidado fundamental com a palavra, porque, muitas vezes, arranco, na minha frase, com a palavra que ele disse na frase anterior. A própria movimentação das personagens é cuidada: no princípio, estou mais centrado num sítio e, depois, começo a apropriar-me do espaço. Tudo isso é feito de uma forma bastante delicada. Além disso, o próprio encenador é bastante delicado e educado e tem uma visão muito clara e limpa da peça."
"Um Homem Inofensivo" está em cena até ao próximo dia 26 de novembro.