Crónicas

"Sozinho em casa", por João Espírito Santo

Sozinho em casa… é o título de um filme, mas, efetivamente, é uma realidade para todos, hoje em dia.

  • 26 fev 2021, 19:00
Professor Doutor João Espírito Santo
Professor Doutor João Espírito Santo

Os meus filhos a estudarem, cada um no seu quarto... e eu preocupado em ver se eles estão concentrados, em perceber se estão a fazer as suas atividades, a cumprir com as videochamadas por Zoom... e sem descurar tudo aquilo que um adulto faz quando tem uma empresa ou um trabalho, em que tem de ver emails, passar informações...

Hoje em dia, cada vez mais, confirmo que a metodologia de educação que temos com os nossos filhos está a fazer com que eles se tornem sozinhos. Sozinhos. Eles e um computador, eles e um tablet. Muitas vezes, até vão buscar dados móveis aos pais, porque, entretanto, já não têm...

E o que fazer quando um filho tem atividades de educação física, outro tem aula de clarinete, e outro tem de aprender a ler? Quando acaba a jornada de aulas, respiro de alívio. É quando penso "como é que vou resolver o dia de amanhã?"

Ter três filhos, com idades diferentes, uma mulher a trabalhar a dar aulas online, e eu a ter de pensar em todo o trabalho da clínica implica toda uma dinâmica de trabalharmos em casa, onde estamos todos juntos, mas que, na verdade, estamos é todos sozinhos, porque cada um está num espaço, por norma, isolado.

É desgastante, é solitário. Solitário, numa travessia imensa, na qual tenho esperança, porque acredito que vamos ser capazes.

Mas, ao mesmo tempo, é muito desolador perceber que não há os jogos que havia no recreio, que não há as brincadeiras nem as interações, quem sabe, até, o primeiro namorico da minha filha, que já está no sexto ano. Não há a festa de finalistas do meu filho, o Dia do Pai vai voltar a ser festejado, novamente, de forma virtual... e isso deixa-me, também, triste e preocupado.

Ao mesmo tempo, acho que faz parte da educação eles terem estas privações, para darem valor ao que é, realmente, importante, e desenvolverem a capacidade de resiliência, de superação e de conquista. Aprenderem a ler ou a fazer o cálculo da hipotenusa, desta forma, não é simples, mas faz parte. As prioridades de cada um são diferentes, tal como as dificuldades.

Hoje em dia, quando me perguntam como está a correr em casa, eu respondo: está a ser positivo, porque estamos a conseguir superar, porque estamos a conhecer-nos melhor, mas, ao mesmo tempo, também está a ser difícil.

Temos de ver as coisas boas: a alegria de acordarmos e não irmos para o trânsito, a alegria de podermos dizer: "Estás bem vestido" ou "já te penteavas"… Estamos a mimar-nos, estamos a cuidar de nós, dentro de casa, estamos a fazer com que a nossa base fique mais sólida, mais preocupada connosco, e, acima de tudo, o seio familiar fica mais protegido, porque estamos a passar mais tempo uns com os outros.

A nossa família faz com que valorizemos o que, realmente, é importante: a saúde, a paz e as conquistas de cada um, de uma forma tão genuína: "Pai, já sei pintar"; "Pai, eu consegui"; "Pai, ouviste este acorde?"… Tudo isto é algo que, se os meus filhos estivessem na escola, eu, se calhar, não estava a ouvir. Se calhar, as partilhas iam ser diferentes. O importante é que estamos juntos e estamos felizes.

Pensar na parte boa da pandemia é pensar que continuamos a sorrir juntos e que vamos continuar a sorrir juntos, após passarmos por esta privação. Apelo à consciência de todos em prol de todos!

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