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"Zango-me porque gosto de ti" pode ser usado como desculpa?

Imaginem, por absurdo, que aplicávamos o racional de "zango-me porque gosto de ti", um dos conselhos veiculados num jornal há dias, para lidar com birras, a outras situações ou relações da nossa vida?

Psicóloga, mestre em Psicoterapia Cognitiva-Comportamental na área da infância e adolescência / OPP: 24317 e Digital creator Dicas reais de gravidez, parto e parentalidade
  • 18 jul 2023, 12:00
Criança
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Ficariam confortáveis em dizer (ou em ouvir!) uma desculpa semelhante? Eu não!

E não é difícil explicar porquê. Não são as dificuldades em gerir as suas emoções, em autorregular-se e autocontrolar-se que explicam as reações do adulto. O adulto zanga-se porque, também ele, fica desregulado! E se queremos ensinar à criança a autorregulação, que com o seu cérebro em desenvolvimento demorará uns bons anos a acontecer, temos que ser o exemplo da mesma.

Significa que nunca nos zangamos? Claro que não! Mas não punhamos as "culpas" no amor que temos por elas.

Porque se assim for, desde cedo, a criança aprende a carregar a culpa das ações dos outros e a validar comportamentos abusivos.

Quando a criança se desregula, como numa "birra", além do sofrimento que isso lhe traz (já comprovado pelas neurociências), ainda tem de gerir a zanga que o adulto "se viu obrigado" a passar só para o bem dela. Ela vai aprender a desligar-se rapidamente daquilo que precisa e da sua dor para cuidar da dor do outro.

Que porta é que aqui se abre ao longo do tempo? A porta da anulação das necessidades individuais, do guardar para não zangar ou entristecer o outro, da carga (enorme) de andar sempre com o "termómetro emocional" na mão para medir como os outros estão e gerir o seu mundo, desresponsabilizado-os disso, das relações abusivas, pois tudo passa a ser válido sobre o pretexto de que "foi para o teu bem".

"Quando ficares desregulada e com as tuas emoções num turbilhão, eu farei de tudo para não ser mais uma fonte de ameaça para ti, tentando regular-me para reagir com acolhimento e não com zanga". É disto que as nossas crianças precisam de ser asseguradas.

Culpar a criança continua a ser o caminho mais fácil. Mas não é certamente o mais saudável.

Tânia Correia e Ana Dida
Psicóloga, mestre em Psicoterapia Cognitiva-Comportamental na área da infância e adolescência / OPP: 24317 e Digital creator Dicas reais de gravidez, parto e parentalidade

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