Entrevistas

Ana Bola: "Levei uma massagem no ego e eu já não sabia o que se sentia"

Numa entrevista exclusiva à SELFIE, Ana Bola falou sobre aquilo que a levou a aceitar o convite de Cristina Ferreira para ir para a TVI e, ainda, levantou a ponta do véu sobre o novo desafio.

Esta é a primeira vez que vai trabalhar na TVI...
É! Às vezes, até acho que estou enganada, ao dizer isso. Mas é a primeira vez, na TVI. É, sim!

Ainda não tinha chegado o momento certo?
Não, pelos vistos, não.

Como é que surgiu este convite?
De uma forma muito simples: com um telefonema, para marcarem uma reunião comigo, porque tinham uma coisa que era "a minha cara". Eu vim e também achei que era "a minha cara".

Qual é o sentimento que fica?
Nós, em Portugal, sobretudo os atores mais velhos, estão muito pouco habituados a serem estimados e úteis. Não é o meu caso. Nunca deixei de trabalhar, a não ser pela imposição da pandemia e, como sou muito autossuficiente, escrevo os meus textos e vou fazendo peças e vou fazendo espetáculos... Aliás, nestes últimos anos, estive só no teatro, porque fiquei muito zangada com a televisão, fiquei muito chateada... Fiquei mesmo chateada. Farta, talvez. Porque fazíamos o "Estado de Graça" [programa de humor da RTP1], que, depois, acabou. Nunca percebemos muito bem por que motivo é um programa que funcionava tão bem acabou... Depois, tivemos saudades uns dos outros, trabalhámos juntos anos e anos... E fiquei um bocado zangada! Achei que, se calhar, a televisão tinha acabado, para mim. E, aliás, disse-o, em algumas entrevistas. Entretanto, recebi outro convite para outra estação televisiva e recusei, porque já tinha feito aquele tipo de personagem, já fiz 1000 vezes esta personagem e não quero repetir processos, o que é um bocado difícil, no meu caso, porque já fiz tanta personagem. Mas esta [do novo projeto, na TVI], nunca fiz! O que me é pedido não é que seja exclusivamente cómico, mas tem, também, alguma profundidade. É uma personagem com várias camadas: pode ser divertida, mas também pode ser uma personagem muito séria e muito irónica, sobretudo. Mais do que ser cómica, ela será irónica.

Sai um bocadinho da zona de conforto, de alguma forma?
Não. Sou muito irónica. Quando falo de ironia, falo daquele tipo de sensibilidade de dizer, na hora certa, uma piada seca, a propósito de qualquer coisa, o que é muito mais fácil de fazer em personagem do que em pessoa, embora também faça isso, de vez em quando, em pessoa. Mas tento ser gentil, de uma maneira geral. E esta personagem pode-me abrir, aqui, um bocadinho esse caminho, porque é uma senhora muito diferente. E, como tem essas camadas todas, é um grande exercício para mim, porque estou muito habituada a fazer coisas que já são muito fáceis de fazer, para mim, por experiência. As mulheres populares, que interpretei durante a vida toda. Ou fazer imitações, fazer caricaturas... Isso, para mim, já é relativamente fácil. Difícil é fazer uma personagem que, como acabei de dizer, tem muitas camadas e tem de deixar transparecer isso. Se conseguir fazer bem essa personagem, e vou aplicar-me ao máximo, acho que pode ser uma surpresa.

Além do desafio que é este projeto, o facto de, também, se ter sentido desejada foi fundamental?
Foi absolutamente determinante. Ser desejada por pessoas que conhecem a minha carreira, desde pequeninas, que a consideram, e que pensaram, sobretudo, num casting para aquela personagem e para as outras. E, realmente, acho que isso nos deixa muito felizes, porque a televisão, hoje em dia, e de uma forma geral, é um bocadinho feita "à martelo", tirando uma situação ou outra. É assim, mundialmente. E este projeto não me parece ser nada assim. Será muito trabalhoso, obviamente, duro, mas pode ser uma coisa inovadora. Acho que as pessoas vão ficar muito atraídas pelo projeto, pela conceção do projeto e pelas várias personagens. É um conceito leve, mas tem uns recadinhos... O que sinto é que está toda a gente muito empenhada nisto. Acredito que vai ser um projeto vencedor. Mas as coisas, em televisão, levam tempo. Instalá-las leva algum tempo. Impor um programa e um conceito que, não sendo novo, é arriscado pode levar o seu tempo. Mas acho que as pessoas vão "agarrar", mesmo.

E quem foi a primeira pessoa a quem contou?
Foi ao Zé [Nabo, marido de Ana Bola], claro!

Como é que ele reagiu?
Teve muito medo que eu me fosse estoirar estupidamente. E vou cansar-me, bastante, mas acho que conseguimos, aqui, arranjar um equilíbrio para trabalhar bastante, mas com "conta, peso e medida", porque tenho uma doençazita ou outra que não tem muita importância e não me posso estoirar. Mas isto não me vai estoirar. É trabalhoso, vai ser trabalho diário, vai começar muito cedo... [risos]. Mas estou muitíssimo contente!

É com o seu marido que se aconselha, habitualmente?
Sim, porque é ele quem me conhece. Já não tenho pai, nem mãe, não tenho irmãos... Ele é quem me conhece. Conhece as minhas fragilidades. Somos casados há quarenta e tal anos. Ele sabe o que sempre quis fazer, o que nunca quis fazer. Conhece-me como ninguém. E isto que vou fazer é uma coisa que nunca quis fazer. Nunca quis fazer. Em primeiro, porque não era grande apreciadora do género, mas isto é outra coisa.

E com uma carreira de quase 50 anos, só deseja fazer aquilo que quer verdadeiramente...
Sim. Aquele convite que recusei aconteceu durante a pandemia e eu estava a precisar de dinheiro, porque tanto eu, como o Zé, estávamos "cancelados", pela falta de trabalho, na pandemia. E, mesmo assim, com muito pouco dinheiro, recusei, porque não era aquilo. E também teria recusado este convite, se não tivesse sentido aquilo que senti. E continuaria a viver de uma forma muito apertada. Mas vive-se e sem morrer à fome. Mas não foi o que aconteceu. Aceitei este convite, porque gostei da personagem e da abordagem, que é muito diferente. Talvez há uns 20 ou 30 anos que não me fazia uma abordagem tão simpática. Não estou a falar do projeto em si, estou a falar só da abordagem da Cristina [Ferreira, Diretora de Entretenimento e Ficção da TVI] e do João [Patrício, Diretor Executivo de Entretenimento e Ficção na TVI]. Faz toda a diferença. Não sou vaidosa, mas descobri, se calhar agora, que levei uma "massagem no ego" e eu já não sabia o que se sentia. Sou muito bem tratada. Quando faço teatro, trabalho só com as pessoas de quem gosto, a minha produtora de teatro é minha amiga... Tratam-me lindamente. Mas, vindo de uma televisão, é algo que já não acontecia há muitos, muitos, muitos anos.

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