Entrevistas

Nuno Gama assinala data especial: "Isto é a minha vida"

A SELFIE esteve à conversa, em exclusivo, com o estilista Nuno Gama.

No sábado, dia 28, acontecerá o desfile comemorativo dos 30 anos da marca Nuno Gama, no Castelo de São Jorge, em Lisboa. A SELFIE esteve à conversa com o estilista sobre este momento especial... e não só!

Comecemos por esta coleção. O que nos pode contar sobre o desfile e sobre a coleção?
Esta coleção é uma homenagem a D. Afonso Henriques e José de Guimarães. D. Afonso Henriques é o nosso sócio número um. De alguma forma, ele é o criador de Portugal. É extraordinário quando penso no facto de alguém, de repente, receber um condado como presente de casamento e não se dar por satisfeito, pegar na espada e vir por aí abaixo e fazer disso um país e aquilo que somos, hoje. Aqui, há dois raciocínios. Que responsabilidade é esta que podemos ter enquanto guardiões desta fronteira e espaço que delimita o país? Qual é o ímpeto que faz com que alguém tenha essa coragem e que, de alguma forma, convença todos os outros à sua volta a juntar-se a ele? José de Guimarães, mestre pintor e escultor. Encontro algum paralelismo, que é quando o artista se retém sobre o branco da tela, ou sobre a pedra bruta e, de repente, lhe dá forma. E dá forma de uma maneira que só ele o poderá fazer e nos encanta. O paralelismo é esse. Por isso é que a coleção se chama "Essência". É essa essência que procuro, de alguma forma, e que acho que nos distingue enquanto portugueses. É fascinante quando estamos rodeados de estrangeiros e lhes perguntamos "Vieram para cá porquê?" e eles dizem "Porque vocês têm qualquer coisa de especial". Esse especial é aquilo que procuro. É a comida, o clima e, há, aqui, algo distinto, que, às vezes, é quase imensurável, é difícil de descrever. É isso que descreve esta coleção. Essa procura intelectual do que está por detrás, até mais do espírito, inclusivamente. Não é o guarda-roupa de Afonso Henriques, na Idade Média, nem uma cópia de José de Guimarães. Mas, sim, o que ambos me dizem.

É a primeira vez, em muitos anos, que não integra o calendário da ModaLisboa e faz um desfile isoladamente. O que é que isso acarreta?
Acarreta responsabilidade, como todos os outros. Talvez haja uma responsabilidade acrescida, porque, além de produzir uma coleção, temos de produzir todo um evento. É muito mais complexo, mas é um desafio. E também não é nada que já não tenha feito, no passado, mas de formas diferentes. Aqui a responsabilidade está toda sobre o meus ombros.

30 anos. Ainda se lembra do primeiro desfile? Que sonhos tinha naquela altura?
Achava que o desfile dos meus sonhos seria com Carmina Burana, de Carl Orff, junto ao rio ou ao mar, numa noite de luar, com calor. Foi exatamente assim que aconteceu. Foi em 1988, no Padrão dos Descobrimentos. Estava uma noite de verão incrível e, de repente, ao som de Carmina Burana, entram cerca de 30 homens. Não foi uma entrada com o pé direito, foi com o corpo todo [risos]. Foi o início da minha história. Estamos a comemorar 30 anos de marca, não os meus anos de carreira. Eu comecei a vender roupa para lojas em 1984. Fazia fatos de banho, camisas e outras coisas. Resolvemos considerar esta data como a nossa comemorativa, embora estejamos a roubar alguns anos. Mas acho que é a data mais fidedigna, digamos.

Os seus desfiles são mais do que isso, são um espetáculo. Como surgiu esta ideia de arrojar sempre que apresenta uma nova coleção?
Eu sou assim. Eu imagino as coisas com uma história e com todo este samba-enredo à volta, como costumo dizer. São coisas que só fazem sentido para mim, mas é aquilo que eu acho que devo fazer. O artista revela-se pela sua diferença e, às vezes, na solidão da sua opinião. Se for igual ou parecido ao que as outras pessoas pensam, não faz sentido. E, por outro lado, tudo é inspiração. É quase como ir para a cozinha e, de repente, ter vários ingredientes com os quais se faz um prato. Na moda e na concepção dos desfiles é a mesma coisa

O que é que ainda lhe falta concretizar enquanto estilista?
Tanta coisa... O perfume Nuno Gama, por exemplo. Voltar ao processo internacional, levar a cultura portuguesa ao mundo, através do meu trabalho.

Como arranjou força para recomeçar sempre que se deparou com algum obstáculo na sua carreira?
Não sei fazer mais nada, isto é a minha vida! Sei cozinhar, gosto dos meus amigos, sei fazer muitas outras coisas, mas, na realidade, o que sei fazer de melhor, o que é a minha missão, é isto. E não consigo desistir, porque seria desistir de mim mesmo e não faz sentido. E as coisas, por mais difíceis que sejam, em determinadas alturas, são oportunidades para aprendermos, para crescermos e para nos pormos em causa. Somos nós os únicos responsáveis pela nossa vida. Podemos fazer tudo o que quisermos.

O Nuno é uma referência no panorama da moda nacional. Que conselhos pode dar a quem está agora a começar?
Primeiro de tudo, terem a certeza que é isto que querem. O querer por um bem maior e não para serem conhecidos e famosos. Acho que isso advém, ou não, do nosso trabalho e da forma como fazermos as coisas. Depois é pormos o capacete e estarmos dispostos a aprender todos os dias. Tudo é uma oportunidade para crescer, para evoluir. Basta só posicionarmo-nos do lado do copo meio cheio e não do do meio vazio. Ter a capacidade de respirar fundo e de encontrar valores, razão, luz no mais profundo do nosso íntimo e fazer disso coisas fantásticas das quais as pessoas possam gostar, admirar, aplaudir e comprar.

Viaje, agora, pelos 30 anos da marca Nuno Gama, na galeria de fotos que preparámos para si!

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