André Carvalho Ramos partilhou, em exclusivo, com a Selfie tudo o que sentiu e viveu no terreno.
“O Pior dia das nossas vidas” é o título da reportagem, mas 2017 é, provavelmente, o pior ano para Portugal, no que toca a incêndios. Depois de Pedrógão Grande, esteve novamente a cobrir esta tragédia…
Não há pior dia do que o 15 de outubro para aquelas pessoas. E são muitas. Pedrógão Grande foi um choque para todos e pensávamos que não iríamos voltar a vivê-lo, mas aconteceu novamente. É inexplicável como, em quatro meses, morrem em Portugal mais de 100 pessoas por causa de incêndios. A dimensão da área ardida do passado domingo é inexplicável, tivemos menos vítimas mortais, mas as zonas norte e centro ficaram absolutamente devastadas. Como jornalista, ter estado nestes dias trágicos é um valente murro no estômago e traz-me a inquietação de como é que tudo isto foi possível, como é que deixámos que a reforma da floresta fosse sucessivamente adiada até chegarmos aqui.
O que sentiu no terreno?
Ainda trago o cheiro a queimado na pele e na roupa, mas o isolamento de muitas povoações é impressionante. Ainda hoje, há pessoas sem eletricidade e é incompreensível como o Estado falha duplamente: na proteção e no cuidar destas vítimas. Ainda assim, é impressionante conhecer histórias como a de Raul Oliveira, um homem que, na noite de domingo, deixou a família em casa e pegou numa carrinha para entrar no meio do fogo e salvar quem encontrasse. Quando chegou a casa, na madrugada seguinte, tinha ardido tudo e não encontrava a família.
O que mais lhe custou nesta reportagem?
O sentimento de impotência. Tudo começou quando ainda estava na redação da TVI e começaram a chover alertas de incêndios um pouco por todo o país até chegar o alerta da proteção civil a dizer que aquele era “o pior dia do ano”. A partir daí, os telefones não pararam de tocar, estive horas a receber telefonemas de pessoas que não sabiam o que fazer, que precisavam de ajuda e que não sabiam de familiares. Fiquei apenas do outro lado da linha, por exemplo, a ouvir pessoas a tentar salvar idosos das chamas e casas a serem evacuadas. A partir daqui, foi fazer a mala, pegar no carro e ir à procura destas histórias. O sentimento de impotência confirmou-se ao ver tanta terra ardida. É preciso fazer alguma coisa por estas pessoas.
Algum depoimento que o marcou especialmente?
A história do Raul foi a primeira que encontrei, quando quem o ajudava nos mandou parar à beira da estrada para falar connosco. “Andei a acudir quem podia e deixei a minha família para trás”. Isto diz tudo sobre o que é ser português.