Nacional

Vanessa Fernandes fala sobre doença mental na primeira pessoa: "As emoções são um verdadeiro superpoder"

A triatleta Vanessa Fernandes assumiu ter sofrido de bulimia e depressão, e que, no auge do problema, conquistou a medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008.

Atleta de triatlo, ex-campeã do mundo e da Europa, medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Pequim. Embaixadora da campanha "VIVA! Para lá da depressão"
  • 4 jul 2023, 18:12
Vanessa Fernandes
Vanessa Fernandes

Agora, embaixadora da campanha "Viva! Para lá da depressão", iniciativa que pretende promover a saúde mental e quebrar o estigma associado à doença mental em Portugal, em especial a depressão, Vanessa Fernandes escreveu, a convite da SELFIE, um texto acerca da luta que abraçou nos últimos anos.


As discussões em torno da doença mental estão na ordem do dia. No entanto, ninguém sabe, ainda, a profundidade com que se manifesta na sociedade. A manifestação no ser humano da sua faceta dolorosa através de pensamentos, emoções e padrões de comportamento, revela, muitas vezes, a influência dos sistemas autoritários que ditaram normas sem equilíbrio, sobre o verdadeiro sentido da evolução do indivíduo. A manipulação autoritária transformou a verdade interna em vazio, e o vazio preencheu o espaço da nossa própria verdade.
 

O ser humano é um ser magnífico, que educado e bem conduzido é de um potencial extraordinário. Sou feita de um corpo, emoções, uma mente que, pelo que se diz, transforma tudo.


Mas se não existir uma condução e uma sustentação equilibrada, será impossível usar essa ferramenta humana da melhor forma. As emoções são também respostas do corpo, por vezes memórias, que se ativam como resultado de momentos presentes, ou futuros. Saber lidar com emoções é precioso, escutar o que nelas existe e saber superar e perceber muitas vezes o porquê da sua existência.
 

Quando deixo que a emoção tome conta do meu terreno interno, fico fora do momento presente, da realidade que me envolve, mas são as emoções que comandam a situação, sejam elas conscientes ou não, e ditam como vou agir. Também essas são poderosas valências que, bem direcionadas, podem ser milagrosas. São um verdadeiro superpoder.

Da sintonia entre mente e as emoções resulta o casamento perfeito, que permite direcionar a energia para o objetivo que torna tudo mais fluído, e possibilita chegar ao coração de tudo, a uma vitalidade que se movimenta com uma direção e uma força incríveis.

Quando existe um desequilíbrio e falta de conhecimento da ponte entre a mente, as emoções  e o corpo, uma destas valências sobressai em detrimento das outras, culminando numa dissociação do corpo e da realidade. Nessa situação, estímulos externos, com que não se consegue lidar, abrem o espaço para a criação de vícios, que surgem para dar sentido à vida ou para aguentar algo que é difícil  de controlar.

A doença mental não é só mais uma forma de nos conhecermos em profundidade, de saber como funcionamos, e de como a nossa mente trabalha, mas, também, um modo de ganhar coragem para confrontar a realidade que se manifesta diante de nós. A doença mental é como qualquer outro sintoma humano, que se declare como "crónico", e não nos deixa viver a realidade tal como ela se apresenta. Ter a consciência desse paradigma existente em nós, é entrar em contacto com algo mais profundo, que nunca quis ser visto, e aceitar a nossa condição humana e como se manifesta no dia-a-dia.
 

A saúde mental é um tema real, que nos deveria obrigar a questionar a realidade em que vivemos, as escolhas que fazemos e onde essas se manifestam. A ajuda externa, por si só, pode não ser 100% eficaz, porque esta é uma luta interior, vivida de forma profunda e, por vezes, de uma dimensão assustadora que toma conta da própria vida, onde a vida deixa de existir. É muito importante conjugar essa ajuda externa com o que sentimos. Saber estar com alguém que profundamente conhece esse nosso espaço é milagroso e curativo. Em isolamento, torna-se um percurso duro, complicado e solitário.


É urgente que essa profundidade da psique humana seja reconhecida, tal como se apresenta, seja partilhada e fundamentada, de modo a criar novos sistemas de apoio e que este apoio se manifeste em comunidades fortes, que acreditam no mote "não largar a mão de ninguém".
 

Acredito que todos nós, a um certo nível, sofremos de alguma forma de mal-estar, de paradoxos mentais que não conseguimos resolver, o que é natural dada a evolução de um sistema que não pára, e onde os humanos têm de se adaptar, vibrando numa loucura que não conseguem mudar.


Ter o apoio de um sistema empático pode ser um caminho, no qual a possibilidade de encontrar uma cura humana verdadeira, sincera e sem manipulações a nível mental, emocional, religioso, espiritual, familiar, etc. é possível. A doença mental é mais um estímulo de que o humano precisa para evoluir, recentrar-se, acreditar na vida e desistir das crenças acerca da morte.
 

Acredito que, dentro de nós, existe um espírito que se quer manifestar e expressar rumo a uma harmonia maior.


Veja, agora, o vídeo com a entrevista concedida por Vanessa Fernandes, a propósito da campanha "Viva! Para lá da depressão".

Vanessa Fernandes
Atleta de triatlo, ex-campeã do mundo e da Europa, medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Pequim. Embaixadora da campanha "VIVA! Para lá da depressão"

Patrocinados