Muitas de nós vivemos com uma sensação de abandono sem que tenhamos sido abandonadas. Ao longo dos anos, fomos ouvindo, por parte dos nossos pais, que "um dia saio porta fora", "quando menos esperares, fujo daqui" ou "quando deres por isso, já me fui embora". Ainda que nenhum destes atos se tenha concretizado, as ameaças pesam, sobretudo na altura em que são feitas - a nossa infância.
Em primeiro lugar, as crianças não conseguem medir o grau de probabilidade de uma ameaça, elas não ficam a avaliar as condições que existem para o adulto as concretizar. As crianças confiam nos adultos e, por isso, levam as ameaças muito a sério, o que deixa sequelas.
Quantos adultos já acompanhei que finalmente se aperceberam de que muito do respetivo medo de serem abandonados por aqueles que amam vinha daqui. Sem querer, com frases como as que partilhei, o adulto passa a mensagem de que o abandono é iminente, que existe uma forte imprevisibilidade no meio e no comportamento do outro e isso gera esse medo do abandono, ansiedade por não se conseguir prever com alguma segurança o que poderá acontecer a seguir.
Muitos de nós vivemos com uma sensação de rejeição. A verdade é que as crianças amam o adulto ao ponto de não verem nele o problema e, por isso, direcionam-no para si - elas é que não são suficientemente boas para o cativarem, suficientemente interessantes para fazerem com que o adulto fique.
Muitos de nós vivemos com uma sensação de que termos o amor de alguém depende só do nosso comportamento. Esta ideia de que quando ajo menos bem, quando o outro fica frustrado comigo, isso faz com que se vá embora, mostra que posso perder com facilidade o amor de alguém.
Muitos de nós vivemos sem percebermos os pesos que carregamos.
Psicóloga Tânia Correia: "Muitas de nós vivemos com uma sensação de abandono"
Num artigo de opinião, a psicóloga Tânia Correia aborda a sensação de abandono que muitos de nós cultivamos desde a infância.
- 20 abr 2023, 14:52
Tânia Correia
Psicóloga, mestre em Psicoterapia Cognitiva-Comportamental na área da infância e adolescência / OPP: 24317