Entrevistas

Dia da Mulher. Fátima Lopes confessa: "Não tenho direitos adquiridos"

Fátima Lopes abriu o coração, em conversa com a SELFIE, sobre o papel da mulher na sociedade, e falou sobre os quase 30 anos de carreira. "Nunca tive nada que caísse do céu", garantiu a estilista.

Fátima Lopes aceitou o desafio da SELFIE e respondeu ao nosso quiz sobre o Dia da Mulher, que se assinala nesta terça-feira, dia 8. Facto curioso: é, também, o dia de aniversário da estilista madeirense, que, em setembro de 2022, completa 30 anos de carreira.

Alguma vez se sentiu discriminada por ser mulher?
Não, porque nunca permiti que isso acontecesse. Acho que está, em cada uma de nós, exigirmos os nossos direitos. Há muita coisa que depende de nós. Ninguém pode dizer que não houve uma tentativa de discriminação, porque houve. Comigo e com toda a gente. Mas a verdade é que, e sobretudo na minha área, ser mulher não é fácil. O mundo da moda parece que é feminino, mas não é. É gerido por homens e a grande maioria dos CEOs e dos criadores das marcas é homens. Mas eu sempre tive essa consciência. Primeiro, comecei por vir da Madeira. Cheguei cá, na condição de outsider. Depois, foi chegar a Paris e ser, outra vez, outsider, sobretudo, porque vinha de um país pequenino e sem tradição de moda. Cada vez que dizia que era portuguesa, toda a gente ficava espantada. No entanto, isto nunca foi um problema para mim. Isto sempre me deu uma motivação acrescida. Acho que todos nós temos muito mais força do que aquela que imaginamos.

Como vê o papel da mulher, atualmente, na sociedade?
Acho que falta sempre muito. E acho que está, sobretudo, na mão das mulheres, na mão das mulheres que educam os filhos e que, ainda, educam, hoje em dia, meninos e meninas de forma diferente. Acho que o erro está aí. Um erro que está entranhado nas sociedades e que, em pleno século XXI, já não deveria acontecer. Não devíamos educar meninas de uma maneira, e meninos de outra. Muita da culpa, se é que se pode chamar assim, é das mulheres. Está na altura de as mulheres abrirem os olhos. Nós, mulheres, temos que exigir igualdade, não podemos ficar à espera.

Inspira-se em alguém?
Eu sempre fiz tudo para mim. Tudo aquilo que fiz, nestes quase 30 anos de carreira, foi sempre desenhado para mim. Não é egocentrismo, mas eu desenho o que gosto de vestir. Sou incapaz de fazer algo de que eu não goste. Portanto, faço para mim e, depois, obviamente, para um número alargado de pessoas que se identifica. A minha moda tem o meu ADN. O grande segredo para sermos felizes passa por gostarmos de nós. Eu não me visto para que os outros me vejam, nem me maquilho para que os outros me vejam. Gosto de me tratar bem e de me arranjar bem para mim. Sou incapaz de estar em casa de pijama. Tenho de estar bem arranjada, porque tenho de olhar para o espelho e gostar de mim.

Quem são as mulheres da sua vida?
A primeira de todas é a minha mãe, obviamente. Depois, as minhas duas irmãs e, de seguida, as minhas sobrinhas. Tenho muitas sobrinhas. Não conheci avós, porque era muito pequenina. A minha mãe era a matriarca, a mulher da força. Tinha uma força incrível. Viveu para os cinco filhos e nunca deixou que nada abalasse a família. Dou por mim a repetir frases da minha mãe que, na altura, achava que eram frases de velhinha (risos). Começo a achar que tudo o que ela dizia faz, efetivamente, sentido.

Considera mais fácil trabalhar com mulheres, ou com homens?
Trabalho bem com toda a gente. Há muita gente que diz que não consegue trabalhar com mulheres. Eu não sou assim, gosto de trabalhar com pessoas. Para mim, não existe mulher ou homem, em contexto profissional. Gosto de trabalhar com pessoas bem-formadas, com boa onda, que sintam que têm mérito naquilo que fazem e que vivam a vida da mesma forma que eu, com um sorriso na cara. E, depois, só sei trabalhar em equipa. Odeio dar ordens. Para mim, não há empregados e patrões. Gosto de ter uma equipa de trabalho e que toda a gente saiba o respetivo papel.

Como é que se sente por ser uma das mulheres mais conhecidas do nosso país?
Ao longo de três décadas, construí uma carreira e o meu nome tornou-se conhecido por uma carreira na moda. Não fiquei conhecida de um dia para o outro. Acabou por ser natural ser conhecida e ter, de alguma, uma responsabilidade acrescida. Tudo aquilo que faço tem que ter um cuidado diferente, porque, a partir do momento em que a nossa voz pode ter alguma repercussão na sociedade, é preciso ter um cuidado acrescido.

Qual é o segredo para o sucesso da sua carreira?
Em primeiro lugar, gostar muito daquilo que se faz. Eu sou agradecida, sou daquelas pessoas que agradece, todos os dias, o que a vida lhe deu. Mas a verdade é que a vida me deu aquilo que eu procurei. Nunca tive nada que caísse do céu. Não tenho direitos adquiridos, porque, na moda, ninguém os tem. De seis em seis meses, voltamos ao zero e o nosso trabalho tem de ser melhor do que o anterior. Nunca tive a vida facilitada, nem por ser mulher e, muito menos, por ser da área da moda. A moda é, talvez, a área criativa mais difícil, porque se cria uma coleção para seis meses. Resiliência é a palavra-chave, em tudo.

O aniversário da Fátima celebra-se no Dia da Mulher. Tem um significado especial?
Eu, a brincar, digo que nasci para representar o sexo forte (risos). É uma coincidência. A vantagem é que a maior parte das pessoas não se esquece. Se calhar, se fosse num outro dia, não receberia tantas mensagens. Acaba por ser giro por isso. Hoje em dia, as redes sociais lembram os aniversários, mas, antigamente, não era assim. Como era o Dia da Mulher, as pessoas acabavam por se recordar de que eu fazia anos.

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