Entrevistas

Gisela João lança single "Louca" e revela: "Sou muito inspirada pelas mulheres"

Após mais de cinco anos sem lançar um disco, Gisela João está em contagem decrescente para a revelação de "Louca", o primeiro single de "Aurora", o terceiro álbum da cantora, que sucede a "Nua", editado em 2016, e "Gisela João", lançado em 2013. À SELFIE, a cantora, de 37 anos, conta como teve de adiar o lançamento do álbum, inicialmente previsto para março de 2020, e revela como viveu os tempos de pandemia Covid-19.

No próximo dia 5 de março termina o interregno de mais de cinco anos e vamos conhecer o single "Louca", do seu terceiro álbum, "Aurora". Como se sente?
Estou muito feliz, porque há muito tempo que não gravo nada. Ao mesmo tempo, este disco era suposto sair em março/abril do ano passado e, de repente, quando tenho um disco pronto para lançar, ao fim de tantos anos sem lançar nada, aconteceu a pandemia e fiquei com isto guardado na gaveta. Então, foi muito doloroso. Será que ainda vale a pena? Será que ainda faz sentido? Porque, todos os dias, nós vamos sendo pessoas diferentes, todos os dias, há uma nova aurora para nós e, de repente, já estou em 2021 e tenho novas coisas a dizer, novas coisas para contar...

É daí que surge o nome "Aurora"?
É muito engraçado como o nome que escolhi para o meu disco faz todo o sentido no momento que estamos a viver. Ainda não existia a pandemia e já tinha escolhido o nome "Aurora" para o disco. As coisas foram-se relacionando de uma forma que parece que o disco ainda faz mais sentido neste momento do que se tivesse sido lançado em março do ano passado. Chama-se "Aurora" e a aurora é esta coisa maravilhosa, quando penso em aurora penso sempre no começar do dia, naquela luz bonita. Encho a minha boca para dizer Aurora, um nome com muita personalidade. Tenho sempre a sensação de que a aurora é um começar de novo, o que me faz super sentido neste momento que estamos a viver.

Este disco é o mesmo que estava pronto para lançar em março do ano passado ou houve coisas que mudou?
Na altura, estava pronto, mas, agora, houve algumas coisas que acrescentei, que não posso desvendar... Quando sair o disco, falamos outra vez! [risos]

O disco marca, também, a estreia de Gisela João como letrista e compositora...
Sim! O que me traz um friozinho na barriga acrescido. Espero que o público goste!

E por que escolheu o single "Louca" para a estreia do álbum?
Acho que todos somos mais livres, principalmente, as mulheres… mas muito facilmente somos chamadas de loucas. "Ai, lá está ela, está louca"; "Ai, está naquela semana do mês"... Muito facilmente somos chamadas de loucas e acho que isso é muito redutor. O single "Louca" está relacionado com isso, com a força de vontade que nós temos. Sou muito inspirada pelas mulheres, porque cresci numa família com muitas mulheres de personalidade forte, e sou muito inspirada pela resiliência que temos em dar a volta às coisas e em levar a nossa avante. Temos sempre uma força muito grande de começar de novo, de largar coisas e seguir caminho, embora sejamos muito complicadinhas, muito complexas, mas essa é a beleza disto tudo! Admiro muito essa loucura sã de ser tão forte e de não ter medo de seguir caminho.

Durante este confinamento, deu em louca?
No primeiro confinamento, como no meu dia-a-dia, normalmente, passo muito tempo em casa, porque não tenho de ir picar o ponto para ir para a loja ou para o escritório. Há muita coisa que gosto de fazer, então, durante este último ano, fui-me ocupando com bordados, com tricô, com croché, com as minhas costuras, a ler… e isso foi maravilhoso, para mim, porque me sentia sempre muito produtiva. Agora, quando veio esta nova vaga, aí, sim, senti que estava a ficar louca! Fiquei muito assustada, porque levo isto tudo muito a sério. Sou aquela pessoa a quem dizem "tens de fazer isto, isto e isto", e eu faço! Só que, de repente, quando senti que a coisa descambou, assustei-me. Houve ali um dia em que tivemos 16 mil casos… e assumo que fiquei mesmo assustada.

Agora que os números da pandemia começam a aligeirar, já tem planos para o regresso ao palco?
Não! Nem penso nisso agora... Até por uma questão de gestão da minha ansiedade, só quero saber quando as coisas forem mesmo confirmadas, porque, com tudo isto, de repente, não temos ideia de quando se vai voltar aos palcos como deve ser.

Como se vive sem as palmas do público?
É difícil! O setor da cultura vive de forma precária há anos. Portanto, quando esta bola gigante da pandemia nos cai em cima, todo este setor foi, praticamente, dizimado. Sei que isto é muito forte de se dizer, mas isto é, de facto, o que está a acontecer. Nós vivemos num país em que não temos sequer 1% do orçamento anual destinado a este setor, e este setor está destruído. As pessoas não têm mesmo noção e, por mais que explique por A mais B, é difícil as pessoas perceberem. Como não pertencem ao setor, é muito difícil as pessoas perceberem. As pessoas estão a morrer à fome! Tudo o que são artes performativas estão devastadas, desapareceram. As empresas não aguentam, as associações não aguentam… não aguentaram. Está tudo a zeros e é muito assustador tentar perceber para onde é que se vai, quando vai ter que se levantar tudo do chão. E, atenção, que eu falo de um lugar de privilégio, porque tenho uma agenda sempre muito cheia, apareço na televisão… Muita gente do meu setor não tem este lugar! Quando falo, falo pela minha equipa. As pessoas não conhecem as caras, mas, sempre que faço alguma coisa, essas pessoas são envolvidas. Falo, principalmente, por todas as pessoas do meu setor a quem o público não conhece as caras.

De que forma se podem apoiar estes artistas?
A União Audiovisual e várias associações do setor têm feito milagres, a fazer coletas, a recolher donativos, a distribuir alimentos, e tudo e mais alguma coisa, para pessoas que trabalham neste setor e que ficaram sem nada. É muito dramático! Não gosto da ideia que, às vezes, transparece de que o meu setor, que trabalha dignamente, tem de andar a mendigar. E ninguém quer mendigar, as pessoas querem é condições para trabalhar! É muito importante que o Governo olhe para nós, nos dê condições que nos permitam trabalhar condignamente, porque ninguém está a mendigar, agora, uma ajuda que, a longo prazo, se resume a nada, porque o dinheiro acaba. Nós queremos é medidas!

E acha que esses apelos são ouvidos por quem de direito?
Nós lutamos bastante, precisamos é que nos oiçam! Somos um país que se diz civilizado e não temos sequer 1% do orçamento anual destinado à Cultura? Quando falamos de Cultura, falamos de tudo o que é raiz, aquilo que nos representa perante os outros países e até perante nós próprios, quando, às vezes, andamos meio perdidos sem saber para onde vamos. A nossa cultura lembra-nos sempre de onde é que vimos e para onde queremos ir, quem é que nós somos!

Acha que o público tem noção desta importância da Cultura?
Acho que sim. As pessoas perceberam que, durante este terror da pandemia que temos estado a viver, sem cultura, sem música, sem livros, sem filmes, sem teatro… não sei como é que as pessoas tinham ultrapassado isto! Acredito que os programas, como o "All Together Now" [a cantora é a presidente do júri do talent show da TVI], que assenta na qualidade, em pessoas que vão ali e cantam bem, podem ajudar. Se não for por aí, quanto mais não seja, uso a minha visibilidade para dar voz a estas questões todas. Porque, se as pessoas ficarem a conhecer estes 100 jurados, quando antes só conheciam três ou quatro, se ouvirem os pedidos deles, já são mais pessoas a ter voz. Além de que passam a conhecer, ainda melhor, as diferentes vertentes do trabalho destes artistas.

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