Entrevistas

Chef Erick Jacquin revela: "Gostaria de ser ator de teatro uma vez na vida"

Numa entrevista exclusiva à Selfie, Erick Jacquin, chef francês que ficou conhecido por ser jurado na versão brasileira do "MasterChef", falou sobre as influências do Brasil nas suas receitas, fez um balanço da participação no "MasterChef" e até revelou que gostaria de ser ator de teatro, nem que fosse uma vez na vida.

  • 6 out 2019, 00:37
Igor Pires

Para uma boa parte dos apaixonados por culinária, cozinhar é um modo de amar os outros. Concorda? É por isso que decidiu seguir a carreira de chef?

Depende, porque isso pode ser uma forma de cozinhar em casa, para a família e para os amigos. Mas existe o lado profissional também e é um pouco mais egoísta que isso. Eu, na verdade, acho que o cozinheiro profissional cozinha, ao mesmo tempo, para os outros e para ele próprio, para provar que ele pode fazer coisa diferente, que é o melhor, que pode competir com os demais. Mas, com certeza, para cozinhar bem precisa ter um coração bom.

Eu nunca imaginei fazer outra coisa. Eu sempre quis ser cozinheiro, desde criança, e meu pai falou: “Você tem certeza? Porque você vai trabalhar quando os outros estiverem se divertindo”. Eu acho que isso não foi problema para mim e nem minha primeira preocupação. Eu nunca imaginei fazer outra coisa e foi natural. Minha mãe sempre cozinhou muito bem. Eu acho que o cheiro da comida lá em casa que me fez ser cozinheiro.  

Apesar de viver há tanto tempo no Brasil, as raízes francesas continuam muito presentes nas suas receitas?

Eu sempre fiz e vou continuar fazendo as receitas francesas. Mesmo estando no Brasil eu não faço receitas adaptadas. As pessoas comentavam: “Ah, mas o restaurante do Jacquin é caro”. E eu sempre respondi que “é verdade, mas vocês estão economizando uma passagem para Paris”. Então, na verdade sai barato ir ao meu restaurante, porque eu levo para as pessoas a experiência da gastronomia francesa.   

O que estes anos no Brasil trouxeram aos seus pratos?

Quem influencia e inspira as produções dos pratos são as pessoas, os clientes. E tem uma outra parte do Brasil que, lógico, são os produtos, o meu dia a dia, esse país que, hoje, faz parte da minha vida e de tudo o que eu estou fazendo. Com certeza influencia muito no meu trabalho. Eu faço consultoria em restaurantes do Brasil, como em Manaus (Amazonas), em Natal (Rio Grande do Norte). Mas eu não uso ingredientes específicos do Brasil nos meus pratos porque eu não vim aqui para adaptar minhas receitas. Eu vim para oferecer a gastronomia francesa para as pessoas. Quem entende de receitas brasileiras são os brasileiros.        

Conhece a gastronomia portuguesa? Tem algum prato preferido?

Os peixes de Portugal são maravilhosos, como o bacalhau, lógico, de que eu gosto muito. Os temperos e azeites também são muito bons, tem produtos de qualidade. Portugal é um país perto do mar e tem uma gastronomia muito boa, forte e com muita presença da cultura. É interessante isso.        

Desde 2014 que é um dos jurados do programa "MasterChef Brasil". Entre tantas edições, recorda-se de algum momento especialmente comovente?

A cada temporada tem uma coisa que marca, uma emoção que chama a atenção, com certeza. Mas hoje eu me acostumei a ser o jurado do MasterChef Brasil. Tanto é que hoje eu não sei se eu sou “o cozinheiro que está na televisão” ou “o homem da televisão que está na cozinha”. Eu passo muito tempo na TV hoje. Gravo e apresento também “Pesadelo na Cozinha”, fiz um reality show que contou minha história na Fox. Eu já fiz muita coisa na televisão. Então, sempre tem momentos em que as pessoas saem do programa, outros vencem, tem muito momento de emoção. Mas eu tento controlar o máximo para não demonstrar. Às vezes, tem um competidor preferido e que eu torço por ele, mas eu nunca vou falar, nunca vou demonstrar.

O MasterChef hoje faz parte da história da gastronomia do Brasil. Ele mudou a maneira que as pessoas se alimentam, o modo de viver no país. No Brasil, a gastronomia das casas das pessoas sempre foi arroz, feijão e uma proteína, como o frango ou uma carne. Agora as pessoas cozinham em casa com MasterChef. Uma vez uma menina me parou na rua e falou: “Graças a vocês, pela primeira vez, eu vi meu pai cozinhar em casa”. Então, esse foi um dos cumprimentos mais bonitos que recebi, fiquei emocionado. Foi bonito, extraordinário.            

Tem sido difícil julgar as receitas dos outros?

Não. Eu gosto de comer. Não é difícil, não. Eu considero apresentação, ponto certo, respeito aos alimentos, o sabor, o tempero, se tem uma coerência no prato. O casamento... a coerência no prato é muito importante.

Que ingredientes são essenciais para ser um MasterChef?

Para ser um MasterChef precisa ser, primeiro, bom jogador, inteligente, saber conquistar o público e a metade dos outros competidores. Além de saber cozinhar, ser rápido, porque o que vale é lutar contra o tempo. Aliás, é o tempo que mata, muitas vezes, os competidores.

Lançou recentemente um canal no YouTube. Por que motivo decidiu avançar com este projeto?

Decidi avançar com o YouTube, porque é o futuro. A televisão na internet vai ser o futuro. E eu me divirto muito porque eu dirijo, então, eu faço o que eu quero. É divertido, eu mostro minha cozinha de verdade, as pessoas que chegam no meio da gravação, minha esposa, os meus filhos. Não tem um guião, nem edição. Eu pego os ingredientes e decido a receita na hora. Em três meses estou com quase 500 mil inscritos.

Além do sucesso profissional, aos 54 anos, viveu um momento único a nível familiar: foi pai de gémeos. Ser pai depois dos 50 anos tem um sabor especial?

Vamos dizer que você tem menos tempo para criar os filhos quando você é pai aos 54 anos. Mas estou gostando muito, acho que vou ficar mais jovem com isso e viver mais tempo.   

Gostava que, um dia, os seus filhos também se dedicassem à culinária?

Eu não vou pedir para ninguém escolher uma profissão difícil, dura, complicada como essa. Eu não vou influenciar eles porque quero que cada um decida o que quer fazer. Se eles quiserem ser cozinheiros, devem decidir sozinhos. E antes deles decidirem eu vou explicar o que é e como é, da mesma forma que meu pai explicou para mim. Meu irmão mais velho trabalhou com meu pai porque antigamente, muitas vezes, os filhos mais velhos assumiam a empresa. Mas eu tenho certeza que meu irmão não queria fazer isso. Então, eu não vou forçar. Gostaria muito de ter um filho cozinheiro, mas eles vão decidir sozinhos. O meu filho mais velho, Edouard, que vive na Espanha, hoje trabalha com eventos e ele passa mais tempo na cozinha do que em outro lugar durante o trabalho. É engraçado isso.        

Com um percurso tão rico, o que sente que ainda falta conquistar?

Eu tenho um sonho... eu gostaria de ser ator de teatro uma vez na vida. Mas acho que além disso, quero conquistar a estabilidade financeira para meus filhos, sem eles passarem necessidade. Isso não é o mais importante porque eu não sou uma pessoa materialista, mas quero ter o mínimo. Eu já perdi um restaurante, quando fali. E desde então eu sempre falei que nunca mais ia abrir um negócio, porque o Brasil é muito difícil com leis trabalhistas e tributárias, não é um país fácil para micro e pequeno empresário como eu.  

Mas não sei fazer fazer outra coisa e eu amo o que eu faço, então, eu vou abrir um restaurante em São Paulo entre final de outubro e início de novembro deste ano, que vai se chamar Président,em São Paulo. E acredito que vai ser diferente, porque hoje estou na TV, minha vida mudou muito, aprendi o que não devo fazer, o que evitar para não errar de novo. Eu sei que não vai ser fácil, mas eu vou mostrar que meu restaurante vai ser muito diferente. Vou cozinhar de frente para os clientes, não vai ter divisória entre o salão e a cozinha. O bar vai ser sem balcão. É um projeto muito diferente.     

- Outras curiosidades:

Qual o prato favorito? Não tenho

O que é que não gosta nada de cozinhar? Miúdos, como buchada

O primeiro prato que aprendeu a cozinhar? Panqueca

O que detesta que lhe façam quando está na cozinha? Tem tanta coisa que eu não gosto que façam na cozinha. Eu gosto que façam o que eu quero. Mas eu odeio cozinheiro que não tem uniforme, essa é a primeira coisa. Quem não tem uniforme não entra na cozinha.  

Quem é o maior fã dos seus pratos? Minha esposa, Rosângela

De quem é que herdou este gosto pela cozinha ou com quem é que aprendeu a cozinhar? Da minha mãe

Uma celebridade para quem gostaria de cozinhar: Nenhuma especialmente porque a maioria das celebridades não gosta de comer. Eu prefiro beber com eles.  

RECEITA DE BACALHAU DO CHEF JACQUIN

É muito importante colocar o bacalhau para tirar o sal e encontrar o ponto certo. Eu gosto de cozinhar ele um pouquinho no vapor, isso é a primeira coisa. Depois eu coloco azeite na panela para dourar o bacalhau. Para finalizar, eu uso um pouco de azeitona amassada. Cozinho a batata com a pele. Depois, tiro a pele, amasso a batata, coloco um pouquinho de sal grosso, azeite e amasso a batata com um pouco de pimenta forte e fresca. Para acompanhar preparo uma bela salada de alface romana com um pouco de alho, azeite e limão siciliano. Gosto de comida simples, que valorize o produto, que a gente sinta os sabores de cada ingrediente.

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