A mim, pôs-me a pensar: e se isto fosse o princípio do fim? Senti uma paz imensa de quem já fez muitos dos seus intentos da bucket list.
Curiosamente, a esmagadora maioria dos problemas que pareciam inadiáveis — o e-mail do chefe que me magoou, a dívida no cartão de crédito, o telefonema dele que nunca chegou, a insinuação maldosa sobre o meu corpo, a frase da minha mãe dita há trinta anos e ainda viva na memória — evaporaram num sopro. Puff. Como folhas secas varridas por um vento que não pede licença.
O que sobrou foi a vida despida de adornos: o conforto de um suspiro profundo, libertando o stress, a ansiedade, os medos, e uma vontade saudável de estar bem no próprio corpo, o desejo silencioso de paz. Decidi então tomar o pequeno-almoço. Se a morte viesse, que me encontrasse de chávena na mão, tranquila, com a boca ainda a saber a croissant.
Sem notificações a chamarem-me para lado nenhum, passei os primeiros minutos num desconforto estranho. O que fazer, afinal, sem gadgets, sem ecrãs, sem a ilusão de urgência?
Foi então que descobri que adoro varrer.
O som suave da vassoura no chão, o gesto repetitivo, tão meditativo, a limpeza física e mental a acontecer ao mesmo tempo. Como se, a cada movimento, eu também varresse uma camada de pressa e dispersão dentro de mim.
Mais tarde, reencontrei um velho amigo esquecido numa pilha de livros: o "Tao da Física", de Fritjof Capra, devorado como água num deserto.
O meu cérebro levou algum tempo a processar a informação. Percebi isso quando, instintivamente, olhei para o canto superior direito do livro à procura das horas. O mesmo gesto automático que fazemos no telemóvel e no computador. Ali, onde costumam gritar notificações e relógios apressados, havia apenas silêncio e papel. O meu cérebro, confuso, lançou um alerta interno: "Estás a ler durante o dia? Erro 404 — realidade não encontrada."
Enquanto lia sobre a interligação entre a física moderna e a sabedoria ancestral, percebi: o mundo pode parar, a luz pode falhar, a tecnologia pode silenciar-se — mas a vida verdadeira, essa, continua disponível. Mais disponível ainda. Basta estarmos atentos.
Terá este abanão chegado para nos despertar para a realidade ou será que precisamos de um apagão de uma semana?
Temos tudo em excesso... menos tempo para nós.
E afinal, o que há de mais importante na Vida? Nada material.
Esquecemo-nos de que o propósito da Vida é aperfeiçoarmo-nos. Será que estamos a fazê-lo?
Talvez a maior lição a tirar deste incidente seja: onde e como gasto o meu tempo?
Como diz Jay Shetty acerca do tempo e prioridades: 15 minutos nas redes sociais: "É o meu tempo!"
15 minutos de meditação: "Não tenho tempo!"
É possível que tenhamos mesmo de rever as nossas tão proclamadas prioridades. É só uma opinião, claro. E, com esta, me vou.