Durante esta última semana, muito se especulou acerca da situação do pai que, alegadamente, terá cometido um crime de homicídio, na forma tentada, contra o filho. Além do facto de a vítima ser uma criança muito pequena, tudo assumiu uma magnitude ainda maior, por o agressor ser conhecido do grande público. Muitos já tinham uma opinião formada acerca deste, que, dificilmente, encaixa no comportamento que agora exibiu.
Todos os técnicos de saúde mental sabem que é impossível e antiético, fazer diagnósticos sem ter estado presencialmente com a pessoa e a ter avaliado. Apenas é viável comentar a situação com base em outros casos semelhantes. Assim sendo, o que desde logo salta à vista é que tudo neste crime é incoerente, a começar pela narrativa apresentada nas redes sociais.
O sujeito partilha com os seguidores uma ideia que, para ele, é real, mas que, certamente, é fruto de um estado delirante.
Numa segunda fase, há o ataque ao filho, justificado de uma forma não plausível, o que faz com que os seus atos se tornem bizarros. É que não se conseguem identificar quais os "ganhos" que poderiam resultar da morte do filho...
"Parece-me claro que se trata de um crime que resulta de uma descompensação do foro psiquiátrico."
O modo como o crime é cometido é, também, bastante invulgar. Convenhamos que o pai facilmente mataria a criança por esganadura, pelo que, a meu ver, terá havido algum "travão interno" que impediu que tal acontecesse.
Por fim, é descrito que, após o crime, foi visto a deambular pelas ruas e que terá dito aos avós da criança, seus pais, aquilo que tinha feito.
Parece-me claro que se trata de um crime que resulta de uma descompensação do foro psiquiátrico. Os surtos psicóticos, como parece ser o caso, surgem de modo abrupto e o comportamento atípico pode permanecer ao longo de um mês. O gatilho é variável, já que tanto se pode tratar de algo específico, como quando é resultado do consumo de algum estupefaciente ou a exposição a estímulos que gerem muita ansiedade, mas também pode ser difícil identificar o que desencadeou o surto, como tal podemos nunca ter uma explicação para o sucedido.
Face a tudo isto, importa que se providencie uma ajuda especializada, independentemente da punição que os seus atos venham a ter. Uma outra questão igualmente importante é a atenção que terá de ser dada, quer à mãe, quer a ambas as crianças. A mãe possivelmente está inundada de sentimentos de culpa por não ter conseguido proteger os filhos deste ataque, ainda que não possamos saber se foi algo que só agora se manifestou. Necessita de ajuda para se reequilibrar emocionalmente e assim poder desempenhar adequadamente o seu papel. Relativamente às crianças, um foi vítima de maneira direta, mas o irmão testemunhou o sucedido, o que é algo muito perturbador e que, se não houver uma intervenção adequada, poderá resultar em sequelas emocionais para toda a vida.