Crónicas

Microbioma oral: o que é e o que diz sobre a sua saúde

Nem tudo o que nos adoece se vê. O corpo fala de várias formas, e uma delas começa num lugar que raramente associamos à saúde global: o microbioma oral.

Cirurgia Oral e Implantologia / OMD - 04663
  • 5 nov, 18:16
João Espírito Santo
João Espírito Santo

As bactérias que habitam a cavidade oral influenciam metabolismo, inflamação e até o envelhecimento. Compreender esse ecossistema invisível é dar um passo em direção a uma medicina mais humana, integrativa e verdadeiramente preventiva.

 

Um universo que vive connosco

 

Dentro e fora de nós existe um mundo que raramente vemos: milhões de microrganismos que trabalham silenciosamente para quase todas as funções vitais do corpo. Este ecossistema, conhecido como microbioma, é considerado hoje um dos maiores órgãos funcionais do organismo humano.

Durante muito tempo, as bactérias foram vistas apenas como inimigas a eliminar. Hoje, sabemos que a saúde depende do equilíbrio entre elas. Quando essa harmonia se perde, a inflamação instala-se e abre caminho a múltiplas doenças - não só na boca, mas em todo o corpo.

 

Da cavidade oral ao intestino: um eixo contínuo

 

A boca é o ponto de partida do sistema digestivo e uma porta de entrada fundamental para o microbioma no organismo. Alterações na flora oral - como a diminuição de bactérias protetoras ou o aumento de espécies inflamatórias - estão ligadas a doenças crónicas como diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e até alterações cognitivas.

O microbioma oral funciona como um espelho silencioso do equilíbrio sistémico, refletindo hábitos, alimentação, stress e estado imunológico de cada pessoa.

 

Inflamação silenciosa: o elo comum

 

Muitas doenças modernas têm origem numa inflamação discreta e persistente. Quando o microbioma se desequilibra, as bactérias podem deixar de ser protetoras e passar a estimular respostas inflamatórias que se espalham pelo corpo.

A gengivite e a periodontite são exemplos claros: focos locais de inflamação que podem afetar todo o organismo. Bactérias associadas a estas condições entram na corrente sanguínea e mantêm o corpo num estado de alerta inflamatório constante. Estudos mostram que tratar esta inflamação oral reduz marcadores sistémicos como a proteína C-reativa e a HbA1c em pessoas com diabetes tipo 2.

 

Alimentação, estilo de vida e microbiota

 

Cuidar do microbioma vai muito além de escovar os dentes. Depende, sobretudo, de como vivemos. Uma dieta mediterrânica, rica em vegetais, fibras e gorduras boas, favorece uma microbiota estável e diversa. Por outro lado, açúcares simples e alimentos ultraprocessados reduzem essa diversidade e aumentam o risco de inflamação.

O stress crónico, o sono insuficiente e o tabaco também alteram o equilíbrio microbiano, enfraquecendo o sistema imunitário. Até o uso excessivo de produtos antibacterianos pode eliminar bactérias benéficas e comprometer o ecossistema natural.

 

Uma nova linguagem na Medicina Dentária

 

A prática contemporânea em Medicina Dentária propõe olhar para o paciente como um sistema biológico interligado. O microbioma é uma das expressões mais diretas desse equilíbrio - uma assinatura biológica que revela muito mais do que a saúde oral.

Testes microbianos, abordagens nutricionais e estratégias anti-inflamatórias personalizadas passam a fazer parte de uma Medicina Dentária preventiva e centrada na biologia. Cada pessoa tem o seu próprio ecossistema: reconhecê-lo e equilibrá-lo é atuar sobre a causa, e não apenas sobre o sintoma.

 

O invisível também conta

 

Não se vê, mas está presente em tudo o que somos. O microbioma participa na digestão, na imunidade, no metabolismo e até na forma como envelhecemos. Cuidar dele é cuidar da base do corpo. A verdadeira prevenção começa no que não se vê, mas sustenta tudo o resto. João Espírito Santo

Prof. Doutor João Espírito Santo
Cirurgia Oral e Implantologia / OMD - 04663

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